quinta-feira, 12 de junho de 2008

Fala baixo que eu sou cego e não surdo

Às vezes a gente custa a entender que um portador de necessidades físicas especiais é capaz de viver de maneira absolutamente normal, desde que sejam feitas algumas adaptações aos objetos e nos ambientes de uso público. Mas, do mesmo modo, é preciso que o restante das pessoas não só respeitem como também acreditem na capacidade do outro.

Certa vez eu andava pelo centro de Sorocaba e, ao passar por uma cabine de telefone, um moço deficiente visual pediu que eu lesse um número de telefone num cartão, querendo ajudar e ir além, peguei o cartão de sua mão e teclei eu mesmo o número no orelhão, por distração ou falta de coordenação motora teclei errado, eu havia falado o número e o moço então pegou o telefone da minha mão e me deu uma lição - teclou três vezes mais rápido do que eu, e certo.

Na Biblioteca Municipal trabalha um senhor chamado Carlos (deficiente visual), o famoso Carlão, conhecido de muita gente, ele se desloca rotineiramente por toda a cidade, utiliza transporte público, estuda, bate papo, enfim...

Hoje, entre um capítulo e outro de um obscuro livro de Hegel, resolvi esfriar a cabeça e sair da biblioteca. Fui pro jardim fumar um cigarro e dali, pude avistar de longe o Carlão chegando pra trabalhar, havia descido do ônibus e vinha lá tranqüilo caminhando, quando de repente, um homem muito bem intencionado se ofereceu para ajudá-lo e começou: “direita” “em frente” “esquerda” “não, direita” “em frente, mas cuidado”, “ai, não não ali”. Resultado, ele tropeçou em tudo quanto foi degrau e bateu em quase todos os obstáculos. Sozinho ele faria o caminho tranquilamente.

Lembrei de imediato do comediante e também deficiente visual Geraldo Magela ( "o ceguinho" ): “fala baixo seu burro, que eu sou cego e não surdo!”

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