Como ‘Una fuerte apuesta en el futuro’ vira ‘Onda de pessimismo’
Hoje se celebram na Argentina os 200 anos da Revolução de Maio de 1810, data que marca o início da luta que culminou, depois de uma cruenta guerra, com a independência do país em 1816.
Sexta-feira começaram as celebrações oficiais, que terminam hoje com um espetáculo do grupo de teatro Fuerza Bruta, que promete cerca de 2 mil pessoas em cena e 19 carros alegóricos contando a historia do Bicentenário.
Sábado e domingo, mais de um milhão de pessoas se reuniram na Avenida 9 de Julho para prestigiar os concertos de música latino americana, rock, folclore e tango. Em numero, o encontro é comparável somente com a campanha eleitoral de Raul Alfonsín, em 1983, que marcou a volta da democracia no país.
Durante o dia, milhares de pessoas também compareceram para ver os desfiles das províncias e dos países convidados, bem como para visitar os enormes pavilhões. E assim foi nos quatro dias, mesmo com chuva. Para completar, a reabertura do Teatro Colón foi impressionante e a seleção ainda goleou o Canadá!
Conto isso porque, depois de um fim de semana em que vi muita gente comemorando, fiquei intrigada com a matéria publicada pelo O Estado de São Paulo e distribuída pela Agencia Estado ontem.
Não tinha nenhuma linha sobre a festa e o título era “Onda de pessimismo atinge a Argentina”.
A matéria é assinada pelo jornalista Ariel Palácios, do qual sou leitora e admiradora, especialmente pelo seu bom humor e abundância de dados. Desta vez, porém, não compartilho com ele o mesmo ponto de vista.
É o seguinte. O jornal Clarín publicou domingo uma pesquisa mostrando como os argentinos se vêem hoje e o que pensam da vida cotidiana, da democracia e do futuro.
O levantamento tem 15 itens, mas o eixo da matéria do Estadão é especialmente um, o que trata da expectativa para o futuro. Para este quesito, Clarín – diário do grupo mais opositor ao governo de Cristina Kirchner – elegeu como título “Uma forte aposta ao futuro do país”.
De acordo com o jornal, as respostas apontam que, mesmo com as crises, o Bicentenário encontra o país com otimismo. “Mais de 56% acreditam que em dez anos teremos um país com uma economia em crescimento, moderno e integrado ao mundo”. Em 2000 esse índice era de 33%.
Tanto é que o desejo de ir-se do país baixou muito. Pela pesquisa, 78% das pessoas não iriam morar em outro lugar, mesmo se pudessem. E 59% acreditam que a melhor opção para seus filhos também é ficar na Argentina.
A matéria do Estado preferiu ver o outro lado e dizer que para 27% dos entrevistados as condições de vida na Argentina não mudarão em nada no futuro. E que “uma de cada quatro pessoas acredita que a melhor alternativa para seus filhos seja ir embora do país”.
Matérias assim reforçam minha impressão de que, em geral, na mídia brasileira pinta-se um quadro excessivamente ruim e pessimista da Argentina, que não confere com o que se vive no dia a dia.
A economia da Argentina está crescendo num ritmo muito rápido (8,1% em marco), a colheita é recorde, o consumo explodiu, o turismo está em alta e o custo de vida ainda é mais baixo que o do Brasil. É verdade que boa parte desse crescimento é fruto das distorções microeconômicas existentes e não se sabe se será sustentado. É preciso esperar.
Trocando em miúdos, não quer dizer que não haja problemas (há um monte, aliás, para um país que esta tentando sair do default) mas não está esse baixo astral que se vende no Brasil! Não acredito que o país tão amargurado e pessimista que o Estadão vê, comemoraria o Bicentenário com a emoção que eu enxergo.
Creio, como dizem aqui, “que me quedo con los que ven el vaso medio lleno”. Nem que seja pela teimosia de acreditar.
Gisele Teixeira é jornalista e escreveu para o Blog do Favre.
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