sábado, 30 de maio de 2009

PSDB, impróprio para estudantes

Ouvi na Rádio Band News FM, uma entrevista com um assessor da Secretaria de Educação de São Paulo, ele falava sobre a distribuição de “livros com conteúdo impróprio” (sic) feita pela secretaria. Ele denunciou ser o incidente causado por um ato de “sabotagem” ou “terrorismo” aplicado contra o governo do estado.

Lamentável!

Estive refletindo e cheguei a conclusão de que aconteceu um ato de geoterrorismo, aplicado contra os estudantes de São Paulo. Ato que dividiu o Paraguai em dois, deslocando uma parte para a Bolívia e a outra sobre o Uruguai, causando a aniquilação da república presidida por Evo Morales e condenando os estudantes de São Paulo a terem sempre as piores notas nas avaliações feitas pelo Enem.

Qual será o próximo ataque? Fujimori primeiro ministro do Japão? Ou a Bolívia anexada pelo Acre?

No meu entender, “conteúdo impróprio” para crianças e adolescente é aquilo que eles assistem na novela das oito da Rede Globo. No que foi impresso nos livros de geografia do estado de São Paulo não há nada de impróprio, inoportuno, inadequado ou inconveniente, o que existe são erro absurdos, que denunciam a má qualidade da educação pública no estado mais rico do país, e que o governo vai tentar responsabilizar algum servidor "mal intencionado".

Para terminar, mal intencionado é o Secretário de Educação de São Paulo, Paulo Renato de Souza, que passa mais tempo criticando o Enem que explicando porque São Paulo tem os piores indices no exame.

quarta-feira, 20 de maio de 2009

Lá se vai Benedetti


A literatura ficou de luto neste domingo (17): o grande poeta uruguaio Mario Benedetti deixou de viver. Ele tinha 88 anos de idade e deixa um legado de mais de 80 romances, ensarios, contos e principalmente poemas que fazem parte da mais elevada expressão do sentimento humano nesta parte do mundo e que registram a crença, como ele dizia, ''na vida e no amor, na ética e em todas essas coisas tão fora de moda''.

Mario Benedetti referiu-se a seu pai, na dedicatória do romance Primavera num espelho partido, que ele fora ''boa gente''. Os poemas de Benedetti dão ao leitor a impressão de que ele próprio podia ser definido assim, como ''boa gente''.

Militante e dirigente de esquerda (em 1971 ele foi um dos fundadores do Movimento 26 de Março, marxista leninista, expressão política do Movimento de Libertação Nacional - Tupamaros), seus escritos oscilaram sempre entre um lirismo tocante e um compromisso social permanentemente reafirmado; muitas vezes, conseguiu a habilidade de unir estas duas dimensões, a lírica e a social, em poemas como este, escrito quando Che Guevara foi morto na Bolívia:

donde estés
se es que estás
si estás llegando
será una pena que no exista Dios

mas habrá otros
claro que habrá otros
dignos de recibirte
comandante
(do poema Consternados, rabiosos, 1967)

ou

Quizá mi única noción de patria
sea esta urgencia de decir Nosotros
quizá mi única noción de patria
sea este regreso al própro desconcierto
(do poema Noción de patria)

ou

los obreros no estaban en los poemas
pero a menudo estavan en las calles
con su rojo proyecto y con su puño
sus alpargatas e su humor de lija
y su beligerancia su paz y su paciencia
sus cojones de clase
qué clase de cojones
sus ollas populares
su modestia e sy orgullo
que son casi lo mismo
(do poema Los espejos las sombras, 1976)

ou

Compañera
usted sabe
que pude contar
conmigo
no hasta dos
o hasta diez
sino contar
conmigo
(do poema Hagamos un trato)

São textos que exprimem uma experiência de vida intensa e rica, que se desdobrou em inúmeras atividades para ganhar a vida (empregado de uma oficina, taquígrafo, caixa, vendedor, contador, funcionário público, tradutor e jornalista, antes viver somente de literatura), e muitas vezes a amarga paciência do exílio. Seus poemas, disse o escritor argentino Pedro Orgambide na introdução a uma antologia, ''são o inventário de um homem de aparência simples, de gesto e voz medida, de um próximo, um 'fulano' que fala de amor'', de ''mulheres nuas, e leva às pessoas sua palavra despojada de solenidade'', perseverando em ''seu ofício de poeta que não é outra coisa senão seu ofício de viver.''

Militante desde a década de 1940 da luta pela paz, foi um incansável crítico do imperialismo dos EUA. Foi um dos fundadores e diretor, entre 1968 e 1971, do Centro de Pesquisas Literárias da Casa de las Américas, em Havana (Cuba). Em 1971, ano de fundação do Movimento 26 de Março, foi nomeado diretor do Departamento de Literatura Hispanoamericana na Faculdade de Humanidades e Ciencias da Universidade da República, de Montevidéu, cargo que manteve até 27 de Junho de 1973, quando um golpe de estado iniciou a ditadura militar no Uruguai. Em consequência, Benedetti renunciou ao cargo na Universidade. Exilou-se na Argentina, Peru e, em 1976, em Cuba. Só voltou ao Uruguai em 1983, depois do fim da ditadura.

No poema Digamos, ele escreveu:

1.
Ayer fue yesterday
para buenos colonos
mas por fortuna nuestro
mañana no es tomorrow

2.
Tengo un mañana que es mio
y un mañana que es de todos
el mio acaba mañana
pero sobrevive el otro

No último domingo, o amanhã de Benedetti acabou, mas - como ele sempre soube - sobrevive em todos nós, os outros.

José Carlos Ruy, no portal Vermelho

quarta-feira, 6 de maio de 2009

A linguagem, as coisas e seus nomes

Na era vitoriana era proibido fazer menção às calças na presença de uma senhorita. Hoje em dia, não fica bem dizer certas coisas perante a opinião pública:

O capitalismo exibe o nome artístico de economia de mercado;

O imperialismo se chama globalização;

As vítimas do imperialismo se chamam países em via de desenvolvimento, que é como chamar de meninos aos anões;

O oportunismo se chama pragmatismo;

A traição se chama realismo;

Os pobres se chamam carentes, ou carenciados, ou pessoas de escassos recursos;

A expulsão dos meninos pobres do sistema educativo é conhecida pelo nome de deserção escolar;

O direito do patrão de despedir sem indenização nem explicação se chama flexibilização laboral;

A linguagem oficial reconhece os direitos das mulheres entre os direitos das minorias, como se a metade masculina da humanidade fosse a maioria;
em lugar de ditadura militar, se diz processo.

As torturas são chamadas de constrangimentos ilegais ou também pressões físicas e psicológicas;

Quando os ladrões são de boa família, não são ladrões, são cleoptomaníacos;

O saque dos fundos públicos pelos políticos corruptos atende ao nome de
enriquecimento ilícito;

Chamam-se acidentes os crimes cometidos pelos motoristas de automóveis;

Em vez de cego, se diz deficiente visual;

Um negro é um homem de cor;

Onde se diz longa e penosa enfermidade, deve-se ler câncer ou AIDS;

Mal súbito significa infarto;

Nunca se diz morte, mas desaparecimento físico;

Tampouco são mortos os seres humanos aniquilados nas operações militares: os mortos em batalha são baixas e os civis, que nada têm a ver com o peixe e sempre pagam o pato, danos colaterais;

Em 1995, quando das explosões nucleares da França no Pacífico Sul, o embaixador francês na Nova Zelândia declarou: “Não gosto da palavra bomba. Não são bombas. São artefatos que explodem”;

Chama-se Conviver alguns dos bandos assassinos da Colômbia, que agem sob proteção militar;

Dignidade era o nome de um dos campos de concentração da ditadura chilena e Liberdade o maior presídio da ditadura uruguaia;

Chama-se Paz e Justiça o grupo militar que, em 1997, matou pelas costas quarenta e cinco camponeses, quase todos mulheres e crianças, que rezavam numa igreja do povoado de Acteal, em Chiapas.


Eduardo Galeano